Carlos Alberto Riskalla F
A interpelação judicial como instrumento apropriado para interromper a prescrição e obter os documen

A reforma trabalhista trouxe inúmeras mudanças no direito material do trabalho e também no rito processual e é nesta seara, do processo do trabalho, que nos deparamos com grande divergência de entendimentos e até mesmo ausência de enfrentamento das inúmeras situações encaradas diariamente pelos operadores do direito.
De fato, o advogado trabalhista encontra grande dificuldade para submeter ao crivo do Poder Reformador os conflitos de interesses que chegam até seu escritório ao se deparar, já de início, com “enormes fechaduras na porta de entrada” que tomam como formas a prescrição, a justiça gratuita e a liquidação da petição inicial, sem contar ainda, com outros entraves, tais como honorários de sucumbência e litigância de má-fé, que devem ser devidamente explicados aos jurisdicionados pelos advogados, seja pelo seu múnus público, seja por sua responsabilização pessoal.
Portanto, para cumprir com os requisitos da inicial e não ter sua petição inicial indeferida ou o processo extinto sem resolução de mérito, inúmeros causídicos vêm lançando mão de ações preparatórias.
Não raras são as oportunidades em que o trabalhador vai buscar auxílio profissional durante a fluência do prazo prescricional e até mesmo nos últimos dias de ver sua pretensão fulminada pelo transcurso do prazo, assim, a primeira atitude a ser tomada é interromper o prazo prescricional visando o resguardo do direito.
Antes da reforma trabalhista, não havia óbice algum para que o advogado protocolasse a reclamação com as razões de fato e de direito que lhe fossem relatadas, sem o acompanhamento de provas documentais, pois, a liquidação definitiva do julgado somente ocorreria após findo o processo de conhecimento, sendo que, durante a instrução processual, a parte Reclamada apresentaria os documentos que detivesse em seu poder.
Hoje a realidade é outra e a necessidade de se apresentar uma petição inicial líquida demanda necessariamente que o suscitante tenha conhecimento de alguns dados relativos ao seu contrato de trabalho, tais como, valores dos salários, férias e gratificação natalina, jornada de trabalho efetivamente realizada, valores percebidos por eventuais paradigmas, regularidade dos depósitos de FGTS, dentre outros, dados estes retratados em documentos que o empregado raramente detém em seu poder, mas a empresa, por outro norte, certamente os terá em seu registro como meios de provas de pagamentos, inclusive para fins previdenciários, fiscais e administrativos.
Ainda que permaneça em vigência o artigo 11, § 3º, da CLT, a distribuição de uma reclamação trabalhista “prematura”, embora tenha o fito de interromper o prazo prescricional, levará o reclamante à condenação aos ônus da sucumbência acaso seja resolvida sem resolução de mérito e, diante do que se observa em alguns julgados mais recentes, poderá inclusive configurar ato sujeito ao pagamento de multa por litigância de má-fé, portanto, não se mostra a melhor opção.
Outra opção seria submeter o conflito às Comissões de Conciliação Prévia que têm o condão de suspender o prazo prescricional, entretanto, raros são os Sindicatos ou Empresas que mantêm em funcionamento uma Câmara com tal desiderato. Um breve recorte no tema central, tenho para mim que reavivar as Comissões seria uma saída aos sindicatos que perderam a contribuição sindical compulsória, inclusive por poder interpelar a empresa para que apresente os documentos relativos do contrato de trabalho em tela quando da sessão de conciliação, mas este é um tema para tratar em outra hora.
Há também aqueles que defendem a mitigação da norma quando para ser líquida a petição inicial dependa de documento que esteja de posse da reclamada aplicando-se subsidiariamente a regra do artigo 324, § 1º, III, do Código de Processo Civil. Por não existir um entendimento uniforme sobre o tema e diante do fato de que muitos magistrados estão extinguindo as reclamatórias sem resolução de mérito com a consequente condenação dos reclamantes nos ônus da sucumbência, por ora, tal medida deve ser evitada.
Eis então que se adotam duas ações preparatórias à reclamação trabalhista; uma para se obter os documentos que permitirão a liquidez da ação trabalhista e outra para se estancar a fluência do prazo prescricional, para somente então submeter a relação de trabalho propriamente dita ao crivo do judiciário.
A primeira, que tem como fim a obtenção dos documentos da relação de trabalho havida, encontra amparo no Código de Processo Civil que prevê dois procedimentos acautelatórios. O primeiro, pelo rito dos artigos 305 a 310 sob a forma de tutela cautelar antecedente com o fim de se promover a exibição de documentos. O segundo, por meio de uma produção antecipada de provas, prevista nos artigos 381 a 383. Sem prejuízo, o código de ritos também possibilita se recorrer da via ordinária por meio de uma obrigação de fazer fundamentada no artigo 497.
Uma vez apresentados os documentos suscitados, o reclamante poderia instruir sua reclamação trabalhista e indicar seu valor, cumprindo assim os requisitos da exordial. Entretanto, é assente na jurisprudência que tais medidas não têm o condão de interromper o prazo prescricional.
Noutro viés, a ação de protesto judicial está prevista no artigo 726, § 2º, do Código de Processo Civil. Tendo em vista a redação aberta do artigo, dá margem as mais variadas interpretações pelos aplicadores do direito que, ora a intentam sob a forma de notificação, ora sob a forma de protesto. De qualquer forma, produz o efeito imediato, qual seja, interromper a fluência do prazo prescricional, nos termos do artigo 202, inciso II, do Código Civil.
Observa-se então que o processo do trabalho, que tem como alguns de seus princípios a oralidade, a simplicidade, a informalidade e a celeridade, acaba por se tornar extremamente formal, oneroso e moroso, até mesmo mais do que o próprio processo comum.
É nesta linha que se propõe o uso da interpelação judicial prevista no artigo 727, do Código de Processo Civil, cuja redação chama a atenção:
“Art. 727. Também poderá o interessado interpelar o requerido, no caso do art. 726, para que faça ou deixe de fazer o que o requerente entenda ser de seu direito.”
A doutrina civilista interpreta este artigo apenas como um divisor de águas entre a notificação e o protesto judicial da interpelação, mas sua redação não deixa dúvidas acerca da possibilidade do interpelante em requerer que o interpelado faça ou não alguma coisa, ou seja, é um instrumento com poder maior do que aqueles do artigo 726.
É neste sentido que se vislumbra uma possibilidade de se utilizar da norma do artigo 727 do CPC para que, no mesmo ato em que o demandante apresente a interpelação judicial com o fim de interromper o prazo prescricional, a demandada seja interpelada a apresentar os documentos relativos ao contrato de trabalho havido nos próprios autos.
Assim, com a acolhida da proposta, cingir-se-ia em um simples procedimento de jurisdição voluntária a interrupção do prazo prescricional e a exibição de documentos, possibilitando que o reclamante venha a apresentar uma reclamação trabalhista devidamente fundamentada, com pedidos certos, determinados e com valores indicados.
Há muito campo a ser perseguido, principalmente quanto aos efeitos que uma determinação judicial com tais comandos pode gerar e seus impactos na futura reclamação trabalhista, mas lança-se a ideia e abre-se o debate, pois, oportuno e necessário.
Originalmente postado em 26/04/2018 na coluna https://www.megajuridico.com/a-interpelacao-judicial-como-instrumento-apropriado-para-interromper-a-prescricao-e-obter-os-documentos-do-contrato-de-trabalho/